segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Morre Jovem o que os Deuses Amam - Part I





Desço a Rua Augusta atrás dela. Traz um vestido creme com um corte a fazer lembrar uma petite française. Leva o cabelo preto apanhado. Desce a rua indiferente aos meus olhares e a de todos com quem ela se cruza. Quando olha para uma montra disfarço como posso. Mãos nos bolsos e assobio para o ar. Demoro a minha atenção nas pedras da calçada. Ela volta a caminhar. Devagar, com uns passinhos tímidos. Caminha como quem não tem pressa. Ou como quem não tem destino. Passeia em Lisboa que brilha hoje. Volta a olhar para uma montra. Volto a disfarçar. Ela olha para trás e por momentos os nossos olhos cruzam-se. Sou salvo por um braço que me puxa para uma arcada. “É a menina Ofélia!”, diz-me o dono do braço. Um tipo magrinho com um bigode aprumadinho. Que me estende a mão de seguida: “ Fernando Pessoa, ao seu dispor”. Agradeço e volto a olhar para a rua. Ofélia lá vai nos seus passinhos pequeninos. “É uma visão, não concorda?”, pergunta-me o tipo magrinho. “É verdade”, concordo. Desisto de ir no seu encalce. Acendo um cigarro. “O Senhor não me quer dispensar um cigarro, se fizer o favor?”. Estendo-lhe o maço e levanto-lhe o isqueiro à altura do rosto. “Muito obrigado”, diz-me e eu faço o gesto com as mãos de que não tem qualquer importância. “De onde a conhece, a menina Ofélia?”, pergunto mais para fazer conversa do que por genuíno interesse. Depois de duas passas no cigarro, pergunta-me se não quero ouvir a história sobre um café e um copo de um vinho tinto servido mesmo como deve ser. Sem planos aceito e sigo-o por ruas de Lisboa que desconhecia até àquele dia.

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