quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

O telefone tocou



Eu atendi e do outro lado uma amiga. E disse: "Comprei uns sapatos de salto alto caríssimos". E eu disse “está bem” despreocupado e ela insistiu, “mesmo caríssimos, de perder a cabeça com o dinheiro que gastei”. E depois começa a falar que só há duas razões para se gastar imenso dinheiro nuns sapatos de salto alto: o casamento e jantar com quem interessa. O que são duas razões que podem estar interligadas. Ri-me de forma provocadora e maliciosa. Ouvi do outro lado da linha um não comeces. E fiquei calado. Até que ela disse que podia dizer qualquer coisa. Mas não tinha nada para dizer. “O dinheiro é teu, mas parece-me que vais querer acabar a noite com os sapatos descalços”, não resisti à provocação. Ouvi-a rir-se do outro lado da linha até que disse que não tinha necessariamente que os descalçar. Perguntei-lhe se a razão dos sapatos é o tipo com quem tem andado. Parece que é. E a coisa é grave, porque os sapatos são para hoje. Voltei a ficar calado. Comprou uns sapatos para um jantar quando todas as mesas de todos os restaurantes estão ocupadas por duas pessoas apenas. Elas com eles, eles com elas, eles com eles, elas com elas. Dizem que é o dia dos afectos hipócritas. O dia dos beijos irónicos. O dia dos amassos obrigatórios. Mas se a noite hoje terminar num enorme orgasmo colectivo, cheio de beijos de língua, corpos suados e as pessoas forem felizes, não vejo onde está o problema. Cada um vive as relações como as entende. Se elas passam por jantar e sexo no dia de hoje, é com eles. Na intimidade de duas pessoas as leis e regras são ditadas a dois. Porque não é celebrar a relação apenas no dia de hoje. Não é olhar nos olhos de quem se gosta apenas hoje. Não é afastar o cabelo do rosto e dizer quanto ela está bonita apenas hoje. É celebrar que ainda se está junto apesar de todas as dificuldade nos outros dias. Porque é difícil. É angustiante, muitas vezes. É complicado. É uma prova de endurace que só se fica mais preparado quando mais se pratica. Não é uma prova de velocidade até à primeira foda e depois por para o lado. As relações custam tempo, custam dores de alma e custam noites mal dormidas. Porque vale a pena amar. Porque vale apenas os beijos que se dão. Porque vale a pena o gosto da pele. Porque vale a pena os risos cúmplices e as brincadeiras estúpidas. Então que se celebre isso mesmo. Se for hoje. É apenas o dia em que se celebra a ligação.

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