segunda-feira, 17 de junho de 2013

Aqui, ninguém vem ao "Engano"

- como é que sabes que eles estão satisfeitos? Não sabes nada enquanto não vires as posições dos pés deles na cama.
- obrigado doutor.
- eu não sou teu médico. Sou teu amigo. Teu admirador.
in Engano, by Philip Roth

A Mancha Humana. Conspiração conta a América. Foram os dois livros que tinha lido de Philiph Roth. Gostei do primeiro. Divertiu-me o segundo. Mas em ambos, ele, o autor, está lá. De uma forma ou outra. Principalmente no segundo, sendo ele o narrador. Roth é comummente apontado como o maior romancista da literatura americana. Aquela que é a minha literatura preferida. Mas, e ele, Roth?

Roth, um judeu, não se consegue largar dessa realidade nos seus livros. E, em Engano, essa questão, do ser judeu, é discutida. A personagem homem, escritor, judeu, meia idade confunde-se com Roth. E sente, ou julga sentir e ver, a descriminação dos outros por ser judeu. O que nos faz perguntar, se Roth se sente diferente por ser judeu, ou quer sentir-se diferente por ser judeu. Um dos momentos mais ricos é quando retratado um episodio de descriminação em que é dito ao personagem homem "nem te vestes como deve de ser". E esse não se vestir como deve de ser era como aquela pessoa que grita imagina um judeu. Porque ambos estão vestido de igual forma. Mostra como a descriminação não faz qualquer sentido e é em muitos casos ridícula. 

Quando soube que este livro era só compreendido por diálogos entre dois amantes adúlteros, antes ou depois de terem sexo, não tive muita vontade de o ler. Nos meus anos, o meu irmão ofereceu-mo. Disse, não podes julgar antes de o ler. O que era verdade. E aos poucos e pouco só pousava o livro para pensar como estava a gostar do livro. É quase cliché dizer-se que Roth perdeu a sua pujança. Se a perdeu, esta, a que o fez escrever Engano, dava para tornar muitos pseuso-escritores em autores de grandes livros. Um livro que tem única e exclusivamente diálogos e obriga a um esforço de imaginação do leitor fora do comum mas o prende, tem de ter a sua arte. E Roth, o sacana, sabe fazer isso. Merece todos os prémios que ganhou. Se dúvidas houverem, é ir à página 130. Todos o mistérios dos amantes e do livro Madane Bovary estão ali em duas páginas. Aposto que Flaubert ficaria contente.




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