quinta-feira, 24 de outubro de 2013

No Meu Bairro Alguém Toca Piano

Ele - imagino que é um ele - toca sempre à mesma hora. Eu sei qual é a janela de onde sai o som das teclas marteladas. Hoje, com o tempo de merda que estava, tocava Chopin. E como eu sei que era Chopin? Porque era a mesma música que aquela rapariga em Nova Iorque me disse que era Chopin.

Naqueles momentos constrangedores em que duas pessoas sobem andares incontáveis de elevador, eu olhava para o chão. Ela estava ao meu lado. Levava um casaco bomber preto. Os sapatos, parados ao lados dos meus, eram elegantes. Também pretos. É possível que toda estivesse vestida de preto. E isso é o que recordo dela. E, sem me dar conta, começo a assobiar a música que tocava no elevador. E ela diz-me que é Chopin. A minha primeira surpresa é que ela é loura. E bonita. A segunda é porque teve necessidade de me dizer que é chopin? O meu inglês atrapalhado, pela surpresa, quando digo simplesmente "I like it". E ela, também em inlgês, mas sem qualquer atrapalhação, diz que também, porque é o compositor que mais gosta de tocar. Ela saiu dois andares antes de mim. Subi o resto sozinho. Quando entrei no quarto Ela estava a ler Lolita na cadeira junto à janela de onde se via o Upper East Side. Sabes que tocam Chopin no elevador? pergunto-lhe.

E é assim que a música nos pode fazer viajar. E são estas a histórias porque os bairros são mais que casas ou prédios. Têm pessoas lá dentro. Pessoas que guardam sonhos e qualidades que nos tocam sem elas saberem.

2 comentários:

Carol disse...

Tive até há bem pouco tempo um vizinho que tocava piano no andar de cima. Acho que nunca o vi. Nem queria. Era maravilhoso. Relaxante. Tenho saudades desse vizinho, para ser honesta. Hoje, por exemplo, estaria-me a saber muito bem ouvi-lo!

E disse...

As melhores histórias estão sempre perto de nós.