Escrever De Borla

Há uns dias - talvez já, pelo menos, uma semana - correu a net um texto do MEC sobre pessoas que pedem a outras para escrever. De borla. Grátis. Sem qualquer compensação. É exposição, dizem eles. Estão a dar-lhes público em troca das palavras. Mas, quem recebe as palavras, ganha alguma coisa com isso. E em troca dá apenas o tal público. 

Não deixa de ser um troca comercial. Desajustada, por vezes. Mas uma troca comercial. Alguém perde tempo. Pensa no tema. Pensa nas palavras. Pensa no resultado final e entrega. Quem a recebe coloca num site, publica em algum lado. Esse lado tem visitas. É indicada a fonte ou o autor e a coisa acaba por aí. Sucede que normalmente as visitas trazem potencial publicitário que é um ganho exclusivo de quem publica. 

Mas há quem não se importa. Quer ver algo seu num sítio que a) admira b) gosta c) acha que é prestigiante. E então está tudo bem. 

Se fazes alguma coisa bem, faz-te pagar. Será um bom mote. 

Já estive nos dois lados. 

Escrevi para um determinado sítio. Cego com o tal público. Afinal, quem escreve, quer ser lido. Isso é quase uma verdade universal. Mas foi quando me pediram para escrever a troco de nada que pensei seriamente no assunto. Qual é a minha vantagem? escrever apenas? Saber que fui eu? Alguém ler e saber de onde vem aquilo que leram? Achei desajustado. 

Quando uma editora me enviou um e-mail. Abri os olhos quando vi o endereço. A respiração alterou-se, Adjectivos elogiosos. E no final a proposta. Era editado. Apenas tinha de pagar. Um preço quase simbólico. Um preço para ver algo meu nas bancas. Agradeci a atenção mas declinei. 

Escrever demora tempo. Podemos não reler. Necessitar de edição. Mas houve tempo. Podemos até gostar. O que torna ainda a coisa melhor. Mas é tempo que estamos a falar. Tempo e um produto final. Que de borla se entrega a outro. E esse tempo nunca mais vamos recuperar. Foi um gosto estar ali. A metralhar as teclas. A pensar. Então, se preferirmos, é um gosto que estamos a entregar a outros.