quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Um dia quis ser uma Rock Star

O meu quarto de infância tinha uma janela enorme. Dava para uma varanda virada por forma a ter sol praticamente todo o dia. E no meu quarto tinha uma raquete de badmiton que imaginava ser a minha guitarra onde rasgava rifs. Tinha ainda um repousa revistas que imaginava ser uma coluna no palco onde apoiava o pé e imitava Steve Harris a tocar baixo. A luz da tarde eram as luzes do recinto. Cegavam-me e não via o público inexistente. A aparelhagem debitava decibéis demasiado altos para os meus vizinhos. Também só ligava quando os meus pais não estavam em casa.
 
Via aqueles reportagens nos suplementos culturais dos jornais dos meus pais e queria ser como eles. Os gadelhudos de cigarros nos beiços e tatuagens escondidas. Cantava raivas e chorava amores. Albúns feitos como objetos próprios. Cada álbum melhor que o outro. Cada tour uma viagem. E eu vivia ali tudo no meu quarto com visto para o sol da tarde. Foda-se, como era bom ser puto.
 
A minha mãe perguntava-me, o que queres ser quando fores grande? Uma rock star dizia eu. Sem saber que outros géneros de música havia. Os meus pais só ouviam isso. Os antigos que aprendi a gostar. A minha mãe, demasiado mãe, dizia sim, filho, conseguimos sempre ser quilo que queremos. Independentemente de não saber cantar. De não ter a disciplina para saber mais do que 3 acordes que o meu tio me tinha ensinado e o ritmo que tinha não me deixava mais que bater no tampo das mesas e fazer barulho com campainhas.
 
Era a segunda metada dos 80. O grunje apareceria na década seguinte. A década em que conheci o punk. Conheci a pop. conheci os pianos e as melodias. Conheci o princípio de tudo. Mas acho que nunca quis deixar de ser uma Rock Star. E hoje, em todos os concertos que vou, penso sempre, o que estão eles a sentir alí em cima? Olham para nós, os que os ouvem e vêem. Discipulos dos sons.
 
Por vezes, em reuniões chatas e aborrecidas, onde todos temos fatos de dois botões, bonitas canetas pousadas ao lado de iphones. Alguns de rostos barbeados outros com barbas de três dias. Entretenho-me a pensar quem são as Rock Stars? Quem teve o sonho dos palcos quando era puto. Quem são os que têm tatuagens por debaixo das camisas. Vestem t-shirts brancas e calçam vans no fim-de-semana. Quem são aqueles que no carro aumentam o som e cantam raivas e choram amores?  

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