Desde sábado que não penso noutro gesto. Nada me marcou mais nos últimos dias que esse gesto. E o Benfica até ganhou um título nestes dias. Mas aquele gesto é o que me fica na memória.
Sábado fui almoçar a Campo de Ourique. Um almoço tardio como se quer nos fins-de-semana. Sem dinheiro no bolso levantámos na máquina da entrada. Quando estávamos virados para a máquina um voz pequenina, de senhora, cansada dos anos, pedia-nos "uma moedinha". Não nos virámos logo. Somos culpados da indiferença diária de quem tem para quem não têm. Há que assumir esta desumanização. Mas a voz pequenina insiste "uma só moedinha, pequenina". E Ela, melhor que eu, mais humana, mais pessoa, virou-se para trás e na sua voz sincera diz que não temos. E não mente. Era verdade. Não tínhamos.
Lá dentro, pedimos o que queríamos comer. Pagámos com o dinheiro que levantámos. Dizem-nos que vai demorar 5 a 10 minutos. E Ela, pega no troco e vai à entrada naquele tempo e dá a "moedinha" à senhora. Eu fiquei para trás. Dividido. Entra parte de ter a sorte de beijar quem é melhor que eu, e aquela senhora que pede, perdida da vergonha de estender a mão.
A senhora agradece-lhe, abre-lhe um sorriso, mas depois há o gesto. Vir-se para mim que estou atrás e diz-me adeus e com os lábios diz-me obrigado. O adeus das avós. Com a mão meio fechada. Porque os anos já apertam mas ainda se levanta para lutar pelo fôlego. Porque ninguém quer morrer. Ninguém quer morrer sozinho. Ninguém quer morrer com fome. E aquela senhora vestida de preto com uma malinha na mão diz-me adeus com a mão livre. E lembra-me a minha avó quando era puto e ia-me embora depois de lanchar.
3 comentários:
abraço camarada. boa semana e grande post!
Também fiquei com a sensação de que podia ser a minha avó, para uma grande maioria dos idosos este é um pais muito triste para se acabar a vida com dignidade :( Mas o texto é lindo :)
O mesmo de sempre
Obrigado
sue
É triste. Apenas isso
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